
Hoje foi o meu dia de finalmente excluir todos os contatos do meu ex de minhas redes. Estou cansada de ter esperanças inúteis, de ter sonhos impossíveis e de ser aquela que eu era com ele.
Já apaguei nossas fotos juntos e ainda estou tentando me acostumar com a foto do meu perfil onde estou só novamente. Logo vou aprender a apreciá-la também.
Sempre odiei ficar sozinha, mas desta vez quero fazer diferente.
Cansei de ir à festas buscando algum substituto para o anterior. Escolhi aguentar o tranco de ficar sozinha e encarar carnaval, aniversário, natal e ano-novo sem ninguém ao meu lado. Resolvi aceitar as brincadeiras maldosas nos encontros com os parentes e de ter que ser olhada com peninha pelas outras sortudas da firma porque elas têm parceiros e eu continuo sozinha.
Já faz alguns meses e acho que a dor começou enfim a cicatrizar ou então, eu já chorei tanto que nem mais tenho lágrimas para escorrer de meus olhos.
Só que passada a tormenta inicial, no segundo mês eu já comecei a entrar em um processo não sei se de aceitação, mas pelo menos de poder enfim ficar mais tranquila mesmo dentro de uma situação tão desconfortável.
O que mais me ajudou foi acompanhar uma influencer no tecinsta que sempre falava: “vamos lá meninas, vocês conseguem! Dá sim para ser feliz sozinha!”. Para ela era fácil aguentar a solidão porque era rica para caramba e tinha muitas distrações, então, nem tinha que pensar tanto no ex como eu.
Mas minha vida era pura rotina: acordar, ir na academia, ir no trabalho em uma empresa de cosméticos e voltar para casa para ficar ou vendo séries ou lendo, até que em um simpósio sobre maquiagens sustentáveis eu o conheci.
-Calma, Solange, que esse rapaz para estar nesse evento deve ser gay – aconselhou-me minha amiga Ana Lúcia, porém, eu ainda me lembro de ter respondido para ela naquela ocasião:
-Ora, Ana, não seja tão preconceituosa. Homens também podem trabalhar com maquiagem! – e o procurei pelas barracas com ofertas de batons, cremes, rímeis, etc., tentando chamar a atenção dele com olhares, sorrisos e até que minha vida ganhou um colorido especial maior do que das maquiagens com as quais eu trabalhava.
Com o Caio eu descobri uma vida muito mais brilhante e animada que eu jamais pensava, e o amor que eu sentia por ele me fazia flutuar. Não fazia mal nem mesmo o stress do trabalho, os problemas em minha área de pesquisa na empresa, os esporros do chefe, o prazo apertado para lançar os produtos… O Caio me mandava mensagens e memes que logo me faziam rir e o dia se transformava completamente.
Ele já era um esteticista e consultor famoso e como tinha que viajar muito, logo encontrou também outras opções e o dia de ser rejeitada caiu feito uma bomba para mim.
Caí em desespero, só chorava, era como se ele não só tivesse ido embora, mas também levado toda a minha tranquilidade e paz.
Só que depois de ter cansado de tanto sofrer e ter procurado alguém que estivesse passando pelo mesmo que eu, definitivamente, fui conseguindo me recuperar e sair da fossa com a ajuda da Mariana Junta-Cacos. Comprei muitos cursos e consumia vorazmente suas vídeo-aulas para aprender coisas como: “Encontre a paz dentro de você mesma”; “Sinta-se bem mesmo que sozinha”; “Esqueça do Passado e Viva o Presente” e tantas outras aulas que enfim me fizeram perceber que ficar sozinha poderia ser algo muito valioso para meu crescimento.
Aos poucos fui me enturmando com outras mulheres sofrendo como eu e fui tomando coragem para me reerguer na vida. Estava cansada de dias e dias rastejando com aquela dor sobre minhas costas e estava decidida a mudar minha realidade.
Mas infelizmente, justo quando eu estava de novo curada e com meu coração inteiro, tive o desprazer de ver o Caio em um simpósio desta vez promovido por minha empresa.
Desprazer porque ele veio todo simpático falar comigo, surpreso com as pesquisas que publiquei há algumas semanas em uma revista importante de ciências naturais sobre plantas brasileiras que poderiam ser usadas no desenvolvimento de sombras e pós para o rosto mais saudáveis e antiidade, demonstrando um interesse que em outros momentos já teria me chacoalhado por inteira, mas ali depois de tudo que eu tinha superado por dentro do mal que ele me fez se separando de mim, definitivamente eu nem me importei.
-Obrigada, Caio – agradeci pelos elogios e ele nem parecia ter encontrado mulheres na França, de onde ele tinha acabado de retornar, pela maneira gulosa que me olhava.
-Então, Solange, depois do evento que tal irmos jantar no restaurante japonês novo que abriu lá na Avenida? Faz tanto tempo que não nos vemos e seria interessante poder ouvir como vão as coisas – ele me convidou, e por um momento eu quase disse não e que eu tinha mais o que fazer (e de fato eu queria mesmo ir logo para casa experimentar os kits que eu havia comprado nos stands), mas resolvi aceitar o convite até porque eu queria muito poder falar para ele o quanto que minha vida estava mesmo sensacional.
Contudo, no fim eu percebi que eu nem precisei me vingar como havia planejado. Eu que queria tanto esfregar na cara dele que eu consegui superá-lo e estava feliz com minha carreira, na verdade, senti é pena de quem eu era.
À medida que o jantar foi transcorrendo, eu me aprofundava em uma experiência estranha, mas muito gratificante: eu me via ali no momento presente ouvindo o Caio e suas viagens fabulosas e cada vez mais eu pensava: “Como pude me apaixonar por este cara?”, “Por que eu me permiti sofrer tanto por ele?”
E então eu me lembrei dos conselhos da Mariana Junta-Cacos. Pedi para ir ao banheiro e ele até meio que se incomodou porque estava muito empolgado falando de si mesmo e do sucesso que ele estava fazendo com suas clínicas em Paris. Então no banheiro eu me abracei em frente do espelho e me lembrei daquela coitada se acabando de chorar no seu quarto, sentindo que seu mundo nunca mais teria graça e percebi que na verdade, não era que minha vida era chata, mas eu que não vivia meu potencial plenamente e quando conheci o Caio, todo confiante, todo feliz consigo mesmo, sei que projetei minhas frustrações com minha vida nele e passei a pensar que se eu o namorasse, teria algo de brilhante na minha vida.
Porém, só tive desprezo, falta de comunicação, falta de ser ouvida e ele queria apenas uma pessoa para aplaudi-lo, só que agora eu já tinha decidido guardar minhas palmas só para mim mesma.
Saí sem nem me despedir. Afinal eu estava atrasada para um programa muito melhor para fazer naquela noite: queria experimentar minhas maquiagens novas e gravar vídeos para meus seguidores e depois maratonar mais um pouco de minha série favorita do momento e, definitivamente, em meu sofá comendo minha pipoca, eu estava me sentindo muito mais plena e acolhida nos braços de minha solidão do que com aquele rapaz que só via a si mesmo ou caçando outro que sempre acabaria por ser só mais um peso em minha vida.
Até aproveitei o fim da noite para deixar uma mensagem para minha ídolo: “Mariana, obrigada por me ensinar a não deixar minha paz e alegria nas mãos de ninguém. Obrigada por me ensinar a não me sentir desesperada com minha própria solidão, mas a amá-la; que o mais importante é minha vida e minha saúde e a como fazer para que no meu coração não exista mais o ódio e o sentimento ruim de brigar contra a vida por estar sozinha. Aprendi com você a ter uma imensa gratidão por esse tempo a mais para a pessoa que eu realmente mais amo: eu mesma. E agradeço por fim por me ensinar que ser uma mulher sozinha não é ser menos do que os outros, mas é ser mais livre e que num mundo de tanta gente prisioneira de aparências, ter momentos de solidão é um luxo.”
Por Gisele Portes
Gostei dos teus textos. Continua investindo na escrita. Sucesso!
Opa, pode deixar! E obrigada pelo comentário! ✨❤️